Sobre fundo branco, dispostas na vertical no canto inferior esquerdo “LINHA DA CULTURA” em letras garrafais na cor preta exceto a palavra “DA” em cinza. Ao lado, uma grande seta apontada para baixo, parte do logotipo do Metrô, preenchida por fotografia onde retrata em posição frontal e de corpo inteiro a pescadora Dirce Conceição dos Santos segurando uma bacia com uma mão ao lado do ombro esquerdo.  À direita da imagem “NÓS”. Abaixo, “Fotógrafo: Paulo Fridman; Curadoria: Diógenes Moura; Realização: Linha da Cultura”.

 

NÓS.

Um retrato será para sempre um retrato. Um livro aberto. Um veredicto. Quando o fotógrafo se expõe diante do “outro” ou haverá a verdade, ou o suicídio. Não existe um retrato “mais ou menos”. Um retrato não é um pôr do sol. Pode ser um grito ou o extrato de um longo silêncio. Em qualquer lugar do mundo esse “outro” será sempre ele mesmo. Quem deverá se modificar é o fotógrafo. Cabe a ele perceber a pele invisível que está presente entre um e outro para mais adiante explodir em fotografia. Será uma imagem, mas sempre será um retrato: risco fino, cornucópia, transparência. O verdadeiro retrato não deixa rastros. Não se trata de uma questão de iluminar o outro com a luz perfeita. Não é um caso para iluminação exterior. Também não é o caso de descobrir a beleza interior, esse pensamento pífio da modernidade com inteligência artificial. Em casos raros um retrato é capaz de ultrapassar as palavras. Assim sendo, nem Deus, nem o diabo, nem Freud, nem Shakespeare serão capazes de desvendá-lo. Nenhum texto técnico ultrapassa um retrato: o seu mundo real e sua cultura de significados, dor e prazer, vida e morte, loucura e paixão. O mundo daquele “outro” que não vê o olhar frontal de uma segunda pessoa: o fotógrafo que tenta decifrá-lo por trás de uma câmera. Trata-se da conjugação de um verbo em seu modo mais extremo. Tempo e tempo. Carne, músculo, sangue, osso. Paulo Fridman andou pelo mundo afora e pelas entranhas do Brasil fotografando trabalhadores em seus lugares de labuta, em planos quase abertos, onde podem ser vistas formas plásticas do ambiente público/privado de cada um deles. Entre panelas de barro e guardas de trânsito, entre a China e o Grão Pará, entre a prostituta e o amolador de facas. O fotógrafo tem profunda habilidade com quem está do outro lado da câmera. Busca neles imagem e palavra. Qual dos dois resistirá ao olhar do outro? Aqui estão. Todos parados diante da câmera, observando. Em cada um deles a pergunta decide o que está por vir: quem é você? O que seu retrato quer de mim?

Diógenes Moura
Escritor | Curador de Fotografia